A vida apenas, com mistificação

Há quem diga que todas as noites são de sonhos.
Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão.”

Willian Shakespeare

Sonhos. Sejam apenas belos; em noites, dias, verdadeiros ou não...

Sonhos. Façam-me suportar a tristeza de estar acordado sem conseguir conquistar meus anseios, minhas vontades, meus amores; anseios, vontades e amores seus ou do mundo.

Mas sonho quando posso, sorriu quando deixam, vivo porque devo (não reclamo).

E você, sonha comigo?


Alessandra

O título que a sorte carrega


Um novo ano sempre vem acompanhado de muita responsabilidade (a que mais pesa é a de ser o melhor de todos, em todos os quesitos). São, na realidade, todos iguais, com passagens parecidas, se não também iguais; pedidos e desejos que, esses sim, são idênticos.

Ao desejar um feliz ano novo normalmente algumas palavras são automáticas, como prosperidade, uma palavra que está intrinsecamente ligado ao ano novo, porque note que ninguém se lembra dessa palavra no resto do ano, nem do que ela significa – é sempre a mesma rotina, somos sempre os mesmos robôs vivendo a mesma vida.

Pensando sobre qual dos desejos clichês de cartões de aniversário, ano novo e essas datas comercias são mais importantes, concluo: Porque não a sorte?

Sorte durante uma prova significa inteligência.

Sorte durante uma cirurgia, saúde.

Sorte durante um encontro, amor.

Sorte durante a guerra, paz.

Sorte durante o choro, alegria.

Sorte na vida, sucesso.

Sorte na carreira, dinheiro.

Ter sorte nesse mundo, caso exista, talvez felicidade.

Tive contato com uma frase - que sim, eu gosto -: “Sorte, merecer e ter”, pelo Guimarães Rosa. É e não é. Sorte é merecimento, mas são tantas outras coisas concomitantemente...


Alessandra.

Eles, tempo e saudade




Ponto final. Eu queria terminar minha vida aqui. Apenas escrever “fim”, deitar, escolher uma pose para morrer e pronto, acaba. Queria não precisar fazer escolhas, ou ao menos não me iludir que eu tenho o direito de fazê-las. Meus passos já foram escritos, desenhados, rabiscados... Quisera eu que os fossem apagados...
- Papai, papai!
- Saia.
- Não papai, o vizinho está te chamando, papai, parece ser urgente.
- Eu não o suporto. Saia.
- Mas papai...
- Saia! Quantas vezes...
Não consegui terminar mais um dos meus discursos infundados, mas nem por isso pouco mordazes. Ouvimos alguns gritos que penetraram a sala pela janela entreaberta, sem que antes os vidros tremulassem. O agudo daquele som que em um dia comum eu ignoraria, naquele momento me trouxe arrepios; não pense, ingenuidade, que não gostei da sensação.
- Vamos ver o que está acontecendo, sempre soube que esse lugarzinho abandonado não era bom o suficiente.
Meu filho segurou firmemente a minha mão e seguimos em direção à rua quase abandonada de onde supomos vir os gritos. Meus sentidos talvez houvessem me traído, o que já não me surpreendia. Olhamos freneticamente para ver se algo ocorrera, e por instantes pensei que não era uma boa ideia ter o meu filho ali. O vizinho que havia me chamado não se encontrava mais ali.
A rua estava vazia, a única inferência na perfeita simetria das árvores dispostas em ambos os lados do asfalto mal pavimentado era um relógio quebrado que se encontrava no chão, a uns quatro passos de nós. A maquinaria encontrava-se intacta, o que me incomodou bastante.
Parei e fiquei olhando aquele objeto que nunca me afeiçoara muito. Nunca gostei de relógios, eles me prendem, eles têm o poder que eu gostaria de ter, tornaram-se meus inimigos em dois momentos que viriam a se repetir por toda a minha vida – a sua também, ressalto-: Primeiramente, quando eu queria que o tempo cessasse por um instante, só para o melhor momento da minha vida se prolongar um pouco, bem pouco (claro, ele só significa o que significa por ter sido momentâneo), e agora, que eu ainda quero que o tempo torne-se finito, e a sua magnitude e força que emana sobre todos, pare por aqui... Mas uma fez, fim.
Quimeras. Eu tinha essa força.
Meu filho se aproximou do objeto com passos lentos, observou-o em curto período de tempo e, para romper com a minha análise, se voltou para mim e olhando fixamente para a bandeira que estava hasteada pouco atrás do meu corpo, disse:
- Podemos ir embora, papai?
Não hesitei, também não o respondi. Apenas me virei e comecei a andar com passos apressados. Ele me seguiu e pela primeira vez tive um momento em silêncio com ele ao meu lado.
Da onde viera aquele grito? Aquilo mexera mais com o meu filho do que comigo. Não gostava de tê-lo em casa, ele era uma criança como qualquer outra, logo eu não gostava do seu comportamento. Mas ele estava quieto, contido, adestrado por um grito que na cabeça dele deveria ter vindo de um relógio. Na minha, todos os meus pensamentos tinham uma paisagem sonora, um tiquetaquear agudo, frio, incômodo. A presença do meu filho extinguia-me.
Nunca gostei desse local, nem das pessoas (mas não há lugar que mudará essa minha repulsão humana). Por que eu não me mudo? TIC TAC. Eu poderia ir para a cidade, ela precisa de mim. TIC TAC. Meu filho iria junto, mesmo que lá as pessoas não tenham sensibilidade de entendê-lo.
Por que meu filho não gritara ainda? É comum ele me interromper quando estou refletindo sobre qualquer coisa sem importância. Aliás, já são 20h, onde esse moleque anda? É um pequeno idiota mesmo, desde que nasceu eu soube que não teria muito futuro, logo ao nascer já se tornou um assassino, me trouxe desgosto no primeiro momento de sua vida. Não é inteligente, atlético, engraçado ou atraente... Além de tudo é totalmente pusilânime. Ninguém gosta de senti-lo.
Nesse momento descobri como a dor pesa, carregava nos ombros o desgosto de um pai, a tristeza de um marido, o medo de uma criança, o tempo do mundo. Descobri o olor da derrota de um homem fraco, vencido pela vida e por minuciosos acontecimentos os quais me sufocam. Queria ser homem para chorar, mas não pude. Só homens fortes choram.
De sobressalto olhei pela janela e encontrei uma multidão que eu nem sabia que existia. Na minha cabeça o maldito relógio não me abandonava, mais frequente, mais doloroso. No chão um corpo caído, mas não pude ver o rosto de quem era; o que importa? Eu não o conheceria mesmo. Ao invés do rosto, via apenas o relógio ao lado, em perfeito estado, e ao redor dele duas pequenas mãos que não me eram estranhas.
Grito pelo meu filho, passo mal. Todo o meu sangue está preso na minha garganta, as palavras se foram. Ele não vem mais, não é? Responda-me! Eu o sinto, ele está comigo...
A voz insuportavelmente aguda e infantil que eu pensara nunca mais ouvir rompeu em repetitivos chamados, juntamente com a mão suave que limpava a minha face da lágrima que estava escorrendo. Papai! Vamos andar de bicicleta, a rua está calma, não tem perigo. Por que você está no chão?
Parei. Olhei no relógio e vi uma hora inexistente, olhei para o meu filho um pouco mais maduro e para as minhas mãos machucadas. Aceitei o convite.
A rua realmente estava calma; eu, agitado.
O que aconteceu aquele dia viraram memórias enfumaçadas na cabeça do meu filho. Na minha só mais um ponto final. O grito foi um assassinato de simples resolução, meu vizinho que tinha morrido. Pouco importa. Mas... Por que ele me chamou? Só mais um ponto final.
Acho que posso escolher agora quando eu quero morrer, é só escrever fim. Não existem relógios mais, não existem cores para preencherem a fotografia da minha vida, quem decide em que momento cada coisa acontecerá sou eu. Não sou concreto, posso morrer sem lhe virem lágrimas, você não notará.
Enquanto a você, viva a meu gosto, é a sua única alternativa.
Vou partir para perturbar quem precisa de mais tempo, os de menos também. Pelo simples fato d’eu poder fazê-lo. Agora que sabe quem eu sou, olhe que horas são, olhe rápido, pois já parto.
Ainda há de haver tempo, ainda há de haver saudade.

Uma lágrima composta de alegrias

Porque o ser humano é tão complexo? Um paradoxo que ama e odeia ali, no mesmo momento. Somos na verdade apenas uma réplica de um arco íris, que resolveu unir o que é sorriso com o que é pranto, a perspicácia da chuva com a idolatria do sol...

A princípio parece apenas uma gota que precisa delicadamente percorrer nossa face, apenas um respingo que leva consigo vários pensamentos, sofrimentos e emoções. É essa a grande simplicidade de uma lágrima. É através dela que falamos o que somos incapazes de proferir verbalmente, talvez por falta de coragem ou somente por não encontrar como se expressar.

Então choramos.

Cada um de um modo, chorando silenciosa ou freneticamente, chorar de felicidade ou de tristeza, de dor física ou psicológica. Dependendo da situação a lágrima vem, sem mais nem menos, e ao notarmos, estamos com os olhos encharcados do que pode ser o banho da nossa alma ou o nosso morrer afogado. Talvez por uma perda, uma conquista, uma revolta... Os olhos estão ali, fadados a ceder ao mundo a água por ele benta.

Mas a complexidade dessas lamúrias pode ser maior do que cogitamos. Ela pode, ao escorrer, ser delicada por levar consigo apenas ocasiões fáceis, são essas as lágrimas injustificáveis, lágrimas tolas. Mas podem também ser pesadas, dolorosas, torturantes, são essas que trazem o martírio das mais tristes e infames causas, significam, do modo mais enfadonho possível, as lágrimas que carregam toda a tristeza do sofredor, tristeza essa acumulada por toda a sua vida, são lágrimas verdadeiras.

Mas para tudo isso há o sorriso, sorriso esse que rejuvenesce, que oferece vida a mais moribunda das criaturas, sorriso esse que glorifica e faz tudo valer a pena. Basta um sorriso vindo da nossa melhor parte (e não apenas dos lábios) para que saibamos o quanto é bom estar aqui, nesse momento, e que o passado é apenas esfumaçadas páginas que ambicionam o presente, mas no presente, ah, o meu presente, eu decido sorrir, para assim, amanhã, eu ter alegria me rondando, e meu sorriso estará carregado desse passado tão conveniente.

Então escolhemos sorrir.

Assim, serei uma simples mistura de mim mesmo... Alegrias e tristezas, turbulências e calmarias, apego e ignorância, entre mim e você e resolvemos seguir a vida, sem entendê-la, mas usufruindo de todos os extremos que podemos: da felicidade repentina a desilusão, dos melhores sonhos e ao acordar, os piores pesadelos. Talvez queiramos jogar sobre as nossas hipérboles um manto para secar nossas tristezas e assim, termos o direito pleno de falar “Eu? Eu sou totalmente feliz”.

Se puder escolher, sorria, se o pranto lava a alma, o sorriso a mantém limpa, se puder escolher, escolha sorrir nos momentos mais difíceis e então perceba o que significa a felicidade, não a felicidade plena, pois essa é utópica, mas a felicidade pura, aquela que oferece-lhe o direito de chorar durante anos e depois sorrir como se nada tivesse ocorrido.


"A felicidade consiste em preparar o futuro, pensando no presente e esquecendo o passado se foi triste." (John Ruskin)

Alessandra


Nuances verde, amarelo e... preto.


Ultimamente, devido a Copa do Mundo, vivenciamos um Patriotismo que não é característico do brasileiro, mas então, até onde isso vai?

Brasil, um dos mais desenvolvidos países da América do Sul é responsável por envergonhar boa parte de seus cidadãos, mas a recíproca é verdadeira. Falta de infra-estrutura básica, educação, saneamento, corrupção, analfabetismo, pobreza em excesso são apenas alguns dos problemas mais eminentes nesse país. Mas, quem mudará isso, se não nós, típicos brasileiros?

Procurando algumas coisas pela internet, deparei-me com comunidades de uma ignorância invejável, algo tão, mas tão estúpido que minha repugnância foi ao auge, sobretudo ao descobrir que existe um movimento para a extinção da Língua Portuguesa (M.E.L.P.). O fato de alguns não saberem diferenciar “mas” de “mais” não é culpa da língua e nem por isso devermos extingui-la e falarmos inglês, por que, ah, o inglês sim é uma boa língua. Pro inferno. Uma das línguas mais ricas é a nossa, e para os que afirmam que “só o Brasil e Portugal falam essa lingüinha de ‘merda’”, informem-se já que essa é a quinta língua mais falada do mundo... Mas desculpem-me, não dá manter uma conversa respeitosa com alguém que escreve “braziu”, ou algo assim e seus melhores argumentos me fazem rir.

Nas comunidades relacionadas, encontro outras como “Desprezo a cultura brasileira” ou algo que se assemelha a “odiadores da MPB”. É claro que ninguém é obrigado a ter o mesmo gosto que eu, mas calma lá, como alguém tem coragem de dizer que tudo que foi composto na Bossa Nova foi “devido a bêbados analfabetos que quiseram compor sobre praia”, é claro que traduzi para o Português compreensível, já que nesses dialetos desprezíveis eu sou, ainda bem, analfabeta.

Sabe, meu nacionalismo bate em diversas barreiras que, aí sim, sou obrigada a concordar com esses... É, com esses. Carnaval, funk carioca, micareta e essas coisas, tudo bem, vocês têm razão, mas não abram a boca para falar da “subliteratura vulgar e pretensiosa”, do “folclore pobre” ou dos “filmes toscos”. Para se criticar algo, é preciso ao menos conhecer superficialmente, e pelo pouco que li escrito por vocês, julgo difícil terem passado da pré-escola com honestidade. Ah, e fico feliz de ter gente que pense igual a mim, e a essa ter valido ofensas como “nerds nacionalistas”, ofensas, aham.

A esses que pretendem ficar sentados em frente a um computador mostrando para o mundo inteiro seu analfabetismo e sua ignorância, podem ir embora dessa terra, é o que o Brasil menos precisa. Agora, àqueles que criticam o país a fim de melhorá-lo, minha real admiração. É fácil falar que tudo é uma imundície nesse país, mas é difícil olhar para si mesmo e perceber que você não deu conta nem de aprender a matéria da 2ª série e teve que colar para passar de ano e hoje ainda orgulha-se em falar sobre a péssima educação no país ou a falta de honestidade presente em “todos”. Meus pêsames.

Aliás, um brinde a alienação que dita os valores dos países desenvolvidos como os corretos e indiscutíveis, os admiro pra caramba.

“O Brasil está em nossas mãos, e não adianta lavar!” (Rogério Silvério de Farias)

Alessandra

Futebol: o ópio do povo

Precisamos de uma válvula de escape, certo Freud?

Junho de 2010. Ao parar e pensar no que esse ano marcará, deparo com uma barreira: a Copa do Mundo de futebol, a primeira em solo africano. Mas afinal, até que ponto vale a pena parar um país inteiro para ver um jogo? É só um jogo...

Pois bem, realmente não acho que o Brasil, a América, o Mundo deva parar para assistir a Copa, mas isso não me dá argumentos para atribuir certas características a esse evento, melhor dizendo, a insultá-lo. É o esporte que uni, que ensina o que é trabalho em grupo, objetivo e sobretudo, respeito, sendo que não estou contando o entretenimento.

Vivemos em um mundo podre e me parece que as únicas coisas que tem repercussão mundial são além de atentados e assassinados hediondos, a Copa. Ruim? Creio que não tanto já que ainda há um suspiro de algo que não é tão perigoso, se me permitem dizer. Já nos acostumamos com os outros fatos corriqueiros e para esses não nos esforçamos em abrir os olhos e ver como “o mundo anda tão complicado” (só para citar Renato Russo, é).

Mas é claro que nem todo indivíduo é obrigado a gostar de futebol, claro. Mas respeitem assim como vocês gostariam que fosse respeitado o gosto de vocês e saibam que, como eu, existem pessoas que gostam e torcem pelo futebol e ainda sim acham bobagem paralisar todo um país por causa disso.

Por isso, torçam o quanto quiserem, gritem, pulem, vivam, se pintem, unam a família, os amigos, façam o churrasco e chorem quando for gol do time adversário... Porque depois voltaremos a notar que estamos imersos numa cruel realidade, a realidade humana em que cospem os atentados e os assassinados, e as lágrimas tornam-se excessiva e infelizmente justificáveis.

"Conheço um meio para voltarmos a encontrar a fraternidade com os animais: o esporte." (Hippolyte Jean Giraudoux)


Alessandra

Gratidão infame

Ah, minha vida entorpecida

Meus segredos furtados, meu coração dilacerado.

Despenco em lágrimas e sorrisos mútuos,

Despenco nos teus ombros,

Nos teus olhos, nos teus sonhos.

Lembro dos nuances mais tolos,

Das desavenças incompreensíveis,

Até de palavras soltas sem significados.

Olho pro espelho,

Nada mais que vidro... E o meu refletir,

Nada mais que eu, ali, presa,

Do mesmo jeito que um dia estive presa a você,

A vocês, a mim.

Agradeço pela vida que outrora me fez sorrir,

Lamento pela vida que outrora me fez chorar.

Agradeço o lamento, e lamento a tua gratidão.

Mas de qualquer jeito, Obrigada.

Agora tentarei sorrir

E então, mostrar-lhe-ei minha face,

Mas só uma delas,

Luzindo uma falsa capacidade de ser feliz.

Alessandra